Parcerias com governos do J-PAL LAC: Reduzindo a Violência de Gênero

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Photo credit: Ricardo Ayllón | GENDES A.C.

Nosso trabalho no J-PAL América Latina e Caribe (LAC) é possível graças à estreita colaboração e dedicação de muitos governos da região que reconhecem a importância do uso de dados e evidências para melhorar programas sociais e políticas públicas. Nos últimos quinze anos, construímos relacionamentos e trabalhamos com mais de vinte organizações governamentais em toda a região. Compartilharemos algumas lições deste trabalho inestimável em uma nova série de postagens intitulada “Parcerias com governos do J-PAL LAC”. Acompanhe as postagens no blog durante os próximos meses.

A violência de gênero (VBG) se manifesta por meio de agressões  psicológicas, econômicas, físicas ou sexuais contra as mulheres. O feminicídio – assassinato de uma mulher ou menina baseado no gênero – é a sua manifestação mais extrema. Em todo o mundo, todos os dias, 140 mulheres e meninas perdem a vida pelas mãos de parceiros ou familiares próximos. Em 2023, o Brasil registrou o maior número de feminicídios, 1.467, desde que o crime foi tipificado por lei em 2015. No México, em 2021, 39% das mulheres que têm ou tiveram um relacionamento, declararam ter vivenciado alguma situação de violência ao longo dos seus relacionamentos. Diante desse cenário, se torna urgente combater a violência de gênero por meio do uso e geração de evidências.

Em resposta a essa situação, o J-PAL América Latina e Caribe (LAC) tem atuado continuamente para que a  igualdade de gênero na região seja tratada como prioridade. No segundo semestre de 2022, esse esforço foi fortalecido graças à  colaboração com o Co-Impact e Community Jameel, que apoiaram a expansão das parcerias com governos para combater a pobreza e a desigualdade de gênero no Brasil e no México. Esta postagem destaca como essas novas parcerias governamentais ajudaram a promover a igualdade de gênero na região e as lições aprendidas durante este período.

Promoção da inclusão financeira e da agência econômica de mulheres microempreendedoras

Uma estratégia para reduzir a violência entre parceiros íntimos é aumentar o acesso das mulheres aos recursos financeiros, uma vez que a dependência econômica em relação aos  seus parceiros muitas vezes as impede de denunciar a violência de gênero às autoridades. Em Pernambuco, estado do nordeste do Brasil, essa é a segunda principal razão pela qual as mulheres não denunciam seus parceiros — a primeira é medo. O contexto de vulnerabilidade social entre as mulheres também fica evidente no aumento da taxa de empreendedorismo, em sua maioria informal: entre 2020 e 2021 o número de mulheres microempreendedoras no estado cresceu 26,3%. As mulheres pernambucanas enfrentam ainda taxas de juros, em média, 6% maiores e o recebimento de apenas 32,3% do montante de crédito destinado as microempresas, apesar das taxas de inadimplência 13,2%  menores em comparação aos homens. 

Com o intuito de resolver essas questões, a Secretaria da Mulher do Recife — capital do estado de Pernambuco —, a equipe do J-PAL LAC e a pesquisadora convidada do J-PAL Fernanda Estevan da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), têm trabalhado em conjunto para encontrar formas de apoiar mulheres que abrem negócios por necessidade. No momento, o grupo de trabalho está  desenhando um  estudo piloto, cujos resultados irão subsidiar  a elaboração de programas sociais e políticas públicas voltados à ampliação do acesso ao crédito, promoção da inclusão financeira e fortalecimento da autonomia econômica  de  microempreendedoras em situação de vulnerabilidade social. 

Se você deseja implementar ou adaptar esse programa para sua organização governamental, entre em contato com Ariana Britto, gerente de políticas do J-PAL LAC em [email protected].

Fortalecimento de programas e políticas públicas voltados para a redução da violência de gênero

A promoção da igualdade de gênero requer a adaptação de estratégias às realidades específicas de cada região e a inclusão de distintos atores. Para contribuir com esse objetivo, em 2024, o J-PAL LAC formou uma aliança tripartite com a Secretaria da Mulher e dos Direitos Humanos de Alagoas e o Instituto Geni — uma organização não governamental (ONG) dedicada à promoção da igualdade de gênero. O principal propósito da parceria é fortalecer a cultura de uso de dados e evidências na formulação de políticas públicas destinadas às mulheres alagoanas. Ao longo de 2024, a equipe do J-PAL LAC e do Instituto Geni realizaram diversas atividades de capacitação voltadas às equipes técnicas do governo. Os treinamentos abordaram tópicos como a importância de avaliar programas sociais, como construir a teoria da mudança e como criar e utilizar ferramentas de monitoramento e avaliação em programas e políticas públicas voltadas às mulheres. Algumas oficinas também contaram com a participação de equipes da Secretaria da Mulher e do Planejamento de Recife.

Outras atividades no contexto da parceria incluem o mapeamento das políticas existentes destinadas às mulheres, com objetivo de melhorar os desenhos de processos e sistemas no estado. Um exemplo desse esforço é o trabalho que vem sendo feito na organização dos dados coletados sobre mulheres vítimas de violência assistidas pela Secretaria para apoiar na reformulação dos formulários e protocolos de atendimento. Esses esforços culminarão na criação do Observatório de Políticas para as Mulheres, que auxiliará a Secretaria no desenho de estratégias mais eficazes, baseadas em dados e evidências, que promovam o empoderamento feminino e reduzam a violência de gênero.

Implementação de um piloto sobre atitudes de gênero na Cidade do México

Nos últimos anos, programas de prevenção voltados  para homens foram realizados para reduzir a violência entre parceiros íntimos e prevenir feminicídios. Professoras e professores afiliados ao J-PAL avaliaram alguns desses programas na Libéria e no Peru. Desde 2020, o J-PAL LAC mantém uma parceria com a Secretaria da Mulher da Cidade do México (SEMUJERES) destinada a apoiar na redução da violência entre parceiros íntimos e à prevenção do feminicídio. Esse trabalho colaborativo também contou com  a contribuição da organização Gênero e Desenvolvimento, A.C, uma organização da sociedade civil especializada em trabalhar com homens para promover mudanças de atitudes em favor da igualdade de gênero e prevenir a violência entre parceiros íntimos.  

Uma das experiências desse trabalho conjunto foi a concepção de um piloto inovador para avaliar o impacto de um programa de prevenção primária direcionado à população masculina da Cidade do México. O objetivo foi transformar e desafiar normas de gênero e dinâmicas prejudiciais que influenciam os relacionamentos emocionais e afetivos. O piloto “Acá entre Compas” ofereceu oficinas voluntárias para 120 homens em 22 centros comunitários localizados em diferentes partes da cidade. Os centros foram selecionados com base em características locais ​​como a prevalência de denúncias de violência de gênero, vulnerabilidade socioeconômica e altos de níveis marginalidade.

Poster containing details of a workshop
Photo credit: SEMUJERES

Se você deseja implementar ou adaptar este programa em sua organização governamental, escreva para Vianney Fernández, Gerente de Políticas do J-PAL LAC, em [email protected]

Parcerias Governamentais: Lições Aprendidas e Oportunidades

Ao longo desse período, as parcerias na região forneceram lições valiosas sobre aspectos-chave a serem considerados na promoção de uma cultura de uso e geração de evidências para avançar na igualdade de gênero. Algumas dessas lições são especialmente úteis ao trabalhar com governos, enquanto outras são mais amplas e ajudam a enfrentar questões mais complexas relacionadas à temática.

  1. Identificar as necessidades centrais das organizações de governo é fundamental para compreender os resultados potenciais da parceria. Dessa forma, as propostas de inovação tornam-se mais relevantes para o governo, à medida que abordam os seus desafios mais urgentes.
  2. Identificar uma liderança que apoie o uso de dados e evidências desde o início (ou seja, alguém na organização com poder de decisão e que reconheça a importância de utilizar evidências rigorosas na formulação de políticas públicas). Ao ter uma liderança como aliada, é possível dialogar com equipes que tenham maior relutância em adotar novas abordagens, abrindo caminho para a institucionalização da geração e uso de evidências.
  3. Nas parcerias com os governos, é essencial garantir que as inovações e melhorias nas políticas públicas surjam de um processo colaborativo entre todas as partes envolvidas. Para isso, todas as equipes diretamente envolvidas com o desenho de uma inovação ou a modificação de um programa devem participar das discussões com equipe de pesquisa e do parceiro.
  4. Reconhecer as diferenças entre a perspectiva da equipe de pesquisa e as necessidades do governo — e encontrar maneiras práticas de manter as atividades em andamento até que seus interesses se alinhem — pode abrir novas oportunidades de fortalecimento da parceria. 
  5. O avanço das inovações voltadas à igualdade de gênero exige colaboração entre diversas partes interessadas — muitas vezes por meio de conexões indiretas. Por exemplo, as oficinas realizadas em centros comunitários frequentemente envolveram outras áreas. Por isso, é fundamental avaliar continuamente o comprometimento e o grau de alinhamento entre os atores envolvidos em prol de uma perspectiva comum. A perspectiva da igualdade de gênero deve ser integrada em todas as etapas do processo de concepção à implementação de um novo projeto ou programa. 

É por meio de iniciativas como essas que as parcerias com governos em andamento no Brasil e no México reforçam o papel do uso e da geração de evidências na construção de um caminho para a igualdade de gênero. Além das lições mencionadas anteriormente, a diversidade do trabalho desenvolvido em cada uma dessas parcerias demonstra a complexidade dos desafios que temos pela frente. Desde o final do ano passado, o J-PAL LAC tem colaborado com formuladoras e formuladores de políticas públicas, pesquisadoras e pesquisadores e profissionais de organizações da sociedade civil na construção de uma comunidade de prática. Esperamos que esses esforços despertem o interesse das múltiplas partes interessadas, permitindo-nos fortalecer e expandir uma rede vibrante e comprometida, que atue de forma colaborativa na construção de sociedades mais justas e equitativas, onde todas as pessoas possam alcançar o seu pleno potencial.

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